As Canções que Você Fez pra Mim

Sobre Temas de Novelas

quarta, 29 de novembro de 2023

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A teledramaturgia entrou na casa dos brasileiros nos anos 50. Os primeiros aparelhos de cinescópio redondo - que hoje parecem ter saído de um filme de ficção cientifica - perderam espaço na sala para novos aparelhos de ultra-definição. 

Boa de ver, a teledramaturgia brasileira também é boa de ouvir, contando e cantando em capítulos e temas (ou faixas) musicais uma história do país. Autores, diretores, compositores e produtores musicais criam um clima para beijos apaixonadas, temas de abertura, mote dos personagens e cenas de suspense. O público acompanha o desenrolar da trama embalados pela trilha sonora,  unindo duas paixões brasileiras: a novela e a música.

Em dezembro 1951, um ano depois da inauguração da televisão no Brasil, a TV Tupi apresentou a telenovela “Sua vida me pertence”. Na trama inaugural acontece o primeiro beijo da TV brasileira entre  Walter Forster e Vida Alves.  Uma música orquestrada dá o clima romântico para o primeiro “selinho” transmitido ao vivo em preto e branco. 

Sem perder as cenas dos próximos capítulos a novela brasileira mudou muito depois do beijo de Walter Forster e Vida Alves.  Graças ao videoteipe, no início dos anos 60, os episódios passaram a ser gravados e exibidos diariamente. Nossos primeiros folhetins, por incrível que pareça, eram adaptações de autênticos dramalhões mexicanos, argentinos e cubanos.  Condes, duque e skeikes tramavam histórias do arco da velha na corte francesa, no Marrocos, no Japão. O divisor de águas da teledramaturgia brasileira é a estreia de “Beto Rockfeller”, produzida, me 1968, pela TV Tupi. Escrita por Bráulio Pedroso e dirigida por Walter Avancini e Lima Duarte. “Beto Rockfeller” rompeu com o estilo dramalhão latino-americano  e deu o pontapé inicial em gramados tupiniquins a novela made in Brasil. 

Nos anos 70 quando erramos apenas “noventa milhões em ação e todos estavam ligados na mesma emoção” a novela brasileira criou um padrão tático  e técnico imbatível. A TV Globo criou as novelas das sete, das oito e das dez. Globo e Tupi dividiam a atenção e os olhares do público. É desse período: “Irmãos Coragem”, “Pecado Capital”, “O Bem Amado”, “Escrava Isaura”, Dancin Days” e “Saramandaia”, (Globo) e “Mulheres de Areia” e “O Profeta” (Tupi). 

Nos anos 80, a estrutura e o “Padrão Globo” de produção de teledramaturgia têm seu final feliz. A novela brasileira vira - como os jogadores de futebol e o samba – nosso grande produto de exportação. Nos anos 80, Lucélia Santos em “Escrava Isaura”, por exemplo, falou de mandarim a russo; Sônia Braga dançou no ritmo em Portugal e na Espanha em “Dancin Days”;  Odete Roitman em “Vale Tudo” morreu nos Estados Unidos, Canadá e Cuba e “Roque Santeiro” enganou muita gente boa por aí até  no México, no Peru e na Polônia.  

Devido às novas mídias e os intermináveis canais de TV a cabo. Nos anos 2000 a novela perdeu um pouco de IBOPE com o telespectador brasileiro.   Os sucessos recentes de “A Favorita” (Globo, 2008) e “Avenida Brasil” (Globo, 2012), mostram que a novela, apesar de alguns pontos a menos na audiência, continua vivinha da Silva e fiel companheira de sala, copa e cozinha de milhões de brasileiras (o) e com audiência altíssima fora do país. 

TRILHAS DE NOVELA QUE MARCARAM A HISTÓRIA

Em 1965, surge o primeiro LP com temas de novelas: ”Salathiel Coelho Apresenta Temas de Novelas”, produzido pelo sonoplasta Salathiel Coelho. O seminal LP da gravadora Copacabana é a pedra fundamental da nossa discografia televisiva. Lá estão onze faixas que evocavam sete novelas da TV Tupi: entre elas “O Direito de Nascer”, “O Sorriso de Helena” e “Tereza”.

O compositor Geraldo Vandré, um dos mais perseguidos no período da ditadura militar no Brasil, tem duas composições no LP “O Primeiro Concerto que Ficou Canção” e  “Marcha Nupcial”.

As principais duplas do cancioneiro nacional fizeram toda (ou quase toda) trilha das novelas: “O Bofe”,  (Globo, 1972) (Roberto Carlos e Erasmo Carlos) ;  “Nossa Filha Gabriela” (Globo, 1971) (Toquinho e Vinicius  de Moraes) e “O Bem Amado” (Globo, 1974); “O Semideus” (Globo, 1973) (Baden Powell e Paulo César Pinheiro) e “O Rebu” (Globo, 1974) ( Raul Seixas e Paulo Coelho)

Quem não cantou o tema de abertura de “Saramandaia” (Globo, 1973) “Pavão misterioso” de Ednardo: “Pavão misterioso / Pássaro formoso /  Tudo é mistério ...”

Outro sucesso foi “Modinha de Gabriela” (Dorival Caymmi) cantado por Gal Costa para personagem principal da trama Gabriela interpreta pela atriz Sonia Braga em  “Gabriela” (Globo, 1975): “Quando eu vim para esse mundo, /  Eu não atinava em nada/ Hoje eu sou Gabriela ...” 

O dilema do motorista de praça Carlão em “Pecado Capital” (Globo, 1976) foi imortalizada por Paulinho da Viola: “Dinheiro na mão é vendaval /  É vendaval!...”

Na pista com As Frenéticas e Sonia Braga em “Dancin Days” (Globo, 1978), muita gente dançou: “Abra suas asas / Solte suas feras/  Caia na gandaia / Entre nessa festa...”  

Censurada pelo regime militar nos anos 70, a novela “Roque Santeiro” reapareceu nos anos 1980 no auge do movimento BRock. Com IBOPE altíssimo o forró "Isso Aqui Tá Bom Demais" de Dominguinhos e Nando do Cordel, tema do personagem Sinhozinho Malta (Lima Duarte) na voz de Chico Buarque e Dominguinhos: “Olha, isso aqui tá muito bom / Isso aqui tá bom demais / Olha, quem ta fora quer entrar / Mas quem tá dentro não sai”

Ainda no contexto do movimento BRock, a Rainha do Rock Brasileiro é também a Rainha da Trilha Sonora das Novelas Brasileiras. É claro que vocês sabem que estamos falando de Rita Lee. Rita é a  interprete com maior número de músicas para trilhas de novelas da TV Globo. Ao longo da carreira, ela somou 79 faixas em discos de novelas na Globo. Sua versão de “Erva Venenosa” foi tema de quatro novelas distintas: “Venenosa, ê \ Erva venenosa, ê \ É pior do que cobra cascavel \ Seu veneno é cruel”

No começo da nova República, Em “Vale Tudo” (Globo, 1988), a cantora Gal Costa (intérprete que mais freqüentou trilhas sonoras) canta “Brasil” de Cazuza:  “Não me Convidaram / Pra essa festa pobre / Que os homens armaram pra me convencer...”

No boom da música sertaneja os dois discos nacionais da novela “O Rei do Gado” (Globo, 1996), vendeu dois milhões de cópias, recorde absoluto na discografia das telenovelas. O cantor Zé Ramalho emplacou “Admirável Gado Novo”, tema dos trabalhadores sem terra do folhetim global: “Vocês que fazem parte dessa massa / Que passa nos projetos do futuro / É duro tanto ter que caminhar...”

 No ano 2000, o forró “Correndo atrás de mim” do grupo Aviões do Forró, a balada “Minha humilde residência” de Michel Teló e o funk de MC Marcinho “Favorita” eram as prediletas da novela “Avenida Brasil” (Globo, 2012): “Gostosa, dengosa, és top é minha favorita! \ Charmosa, fogosa, és top é minha favorita!...”

Essa breve narrativa da trajetória musical da telenovela brasileira ajuda a entender que esse cancioneiro, além de embalar pares românticos, aventureiros, heróis e vilões, conta uma parte importante da história cultural e social do país. A partir de um olhar para esses temas, podemos mergulhar na maneira como foi moldado, o caminhando e o gosto musical popular no Brasil através dos personagens e tramas que constroem nosso imaginário.


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