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Não tivemos Carnaval, mas sempre teremos Silas

domingo, 14 de março de 2021

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Especialistas no assunto (e não são poucos) garantem: entre os melhores sambas-enredos de todos os tempos no Carnaval carioca estão, com lugar cativo, os que trazem esses versos:

“Ô, ô, ô, ô, liberdade senhor.../Passava noite, vinha dia/O sangue do negro corria, dia a dia/De lamento em lamento, de agonia em agonia/Ele pedia o fim da tirania” ("Heróis da liberdade", Império Serrano/1971); “Carnaval, doce ilusão/Dê-me um pouco de magia/De perfume e fantasia/E também de sedução/Quero sentir nas asas do infinito/Minha imaginação” ("Cinco bailes da História do Rio", Império Serrano/1965); e “Vejam esta maravilha de cenário/É um episódio relicário/Que o artista num sonho genial/Escolheu para este carnaval” ("Aquarela brasileira", Império Serrano/1964).

Em todos esses sambas antológicos, uma marca comum e marcante: o compositor Silas de Oliveira, poeta dos carnavais. Sozinho ou com parceiros do gabarito de Mano Décio da Viola, Manoel Ferreira, Dona Ivone Lara ou Bacalhau, Silas conquistou posição indiscutível como o maior vencedor e mais brilhante autor de sambas para desfiles de escolas. Sempre com versos inspiradíssimos e uma pegada melódica responsável por conduzir, com magia e leveza, a verde e branco de Madureira por tantos brilhos e tantas glórias.

O carioquíssimo Silas Oliveira de Assumpção nasceu em Madureira, bairro de onde nunca se afastou, no dia 4 de outubro de 1916. Filho de um pastor protestante, chamado José Mário de Assumpção, teve infância modesta, porém decente, com instrução sólida e educação rígida. Foi criado na Rua Maroim (hoje Rua Compositor Silas de Oliveira), no sopé do morro da Serrinha, onde o Império começou, onde muita coisa boa começou, onde o futuro compositor da escola começou a praticar, com um prazer cada vez maior, o samba e o jongo, companheiros e fontes de inspiração a vida inteira.

No samba, quase sempre se entra por causa das más companhias; e continua-se por causa das boas. Daí que a vida de Silas tomou o rumo da felicidade quando ele conheceu Antônio dos Santos, o Mestre Fuleiro (tio de Dona Ivone Lara) e Décio Antônio Carlos, o Mano Décio da Viola. Com este último, ele compôs o primeiro samba, "Meu grande amor", em 1934. Passou a frequentar a escola de samba Prazer da Serrinha, onde, além de integrar a bateria, deu os primeiros passos como compositor.

Silvas de Oliveira e Mano Décio da Viola (Foto: Reprodução)

O primeiro samba-enredo veio ao mundo e à quadra em 1946, "Conferência de São Francisco", com Mano Décio. A escola ainda era a Prazer da Serrinha. Só em 1947 fundou a Império Serrano,  juntamente com  Molequinho, Fuleiro e outros bambas. Por 14 inesquecíveis carnavais o Império cantou sambas de Silas de Oliveira; e duvido que alguma vez tenha se arrependido. Quando não estava cantando samba na quadra nem no terreiro, Silas estava cantando nas rodas de samba, da Zona Norte a Sul, onde fosse convidado.

Foi numa dessas que o coração de poeta pregou uma peça: quando participava de roda no Clube ASA, em Botafogo, promovida pelo compositor Mauro Duarte, Silas teve um infarto fulminante. Era o dia 20 de maio de 1972. O corpo foi velado na Associação das Escolas de Samba do Rio de Janeiro e o enterro foi acompanhado pelos maiores nomes do Carnava carioca. Os jornais da época dizem que cantavam, no cemitério, os versos de "Herói da liberdade".

Luís Pimentel 


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