Colunista Convidado

O auge da Era do Rádio

sábado, 25 de maio de 2019

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A partir de meados dos anos 1940, houve o que podemos chamar da explosão da Era do Rádio por duas razões: a popularização dos programas de auditório (antes mais raros) e o advento da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, que a partir de 46 virou uma grande potência com transmissores que chegavam a todo o país, importante até na unificação cultural do país como nação. Este auge da Era do Rádio – que teve outras emissoras fortes como as Rádios Tupi e a Mayrink, do Rio de Janeiro, a Record de São Paulo e a Jornal do Comércio de Recife

Esta época coincide com a explosão do baião, estilizado por Luiz Gonzaga (e seus parceiros Humberto Teixeira e Zé Dantas), cujo gênero que deu voz também a duas grandes cantoras, a Rainha do Baião, Carmélia Alves, muito famosa na primeira metade da década de 1950, a bordo de êxitos como “Sabiá lá na gaiola”, “Trepa no coqueiro” e “Adeus, Maria Fulô”, depois fazendo longa carreira internacional divulgando a música brasileira pelo mundo, e a Rainha do xaxado, Marinês, esta a partir de 1957, com “Peba na pimenta” e “Pisa na fulô”, ambas do estreante João do Vale. Dilú Mello (também compositora, autora de “Fiz a cama na varanda”, com Ovídio Chaves) e Adelaide Chiozzo gravitaram entre toadas e canções caipiras/sertanejas e nordestinas, sendo esta última grande atriz das chanchadas da Atlântida, cujo maior êxito foi “Beijinho doce”, em duo com sua colega de sets, Eliana de Macedo.

Mas as quatro maiores estrelas, de extrema popularidade nesse tempo, foram mesmo Emilinha Borba, Marlene, Dalva de Oliveira Ângela Maria

Inicialmente Emilinha Borba, que gravava desde 1939, a partir de 1947 vira um ícone, sendo uma das principais artistas da Rádio Nacional, batendo ponto no Programa César de Alencar, o maior de seu tempo. Devido a algumas faltas da cantora no mesmo, a emissora decidiu criar uma rival para ela. Foi quando descobriram Marlene, então uma cantora de elite, do Copacabana Palace, que acabou vencendo o concurso de Rainha do Rádio em 1949, graças a uma artimanha de seus diretores, desbancando Emilinha, a franca favorita. O plano deu certo e a rivalidade acabou beirando a patologia. A partir de então o Brasil se dividiu entre “emilinistas” e “marlenistas”. Ambas foram grandes cantoras de meio de ano (o samba-canção “Se queres saber”, o bolero “Dez anos (Diez años)”, a primeira; o baião “Qui nem jiló” e a embolada “Tamanqueiro”, a segunda) e de carnaval (as marchas “Chiquita Bacana”, “Tomara que chova”, a primeira, os sambas “Lata d´água”, “Mora na filosofia”, a segunda). Vale dizer que Marlene era uma cantora moderna, de repertório bem escolhido, com uma forte presença de palco, que o tempo transformou também em grande atriz.

Nesse meio tempo, surgiu Dalva de Oliveira, egressa do Trio de Ouro – que cantava com o marido Herivelto Martins e Nilo Chagas, desde 1936. Após uma conturbada separação, a cantora seguiu carreira solo a partir de 50, se tornando uma referência de voz feminina no país, com seu vasto alcance vocal e suas interpretações sofridas do gênero mais importante daquela década, o samba-canção (“Errei, sim”, “Tudo acabado”, “Fim de comédia”), mas consagrando-se também cantando baião (“Kalu”), boleros, tangos e especialmente marchas-rancho, como “Estrela do mar” (“Um pequenino grão de areia...”). A troca de farpas musicais entre ela e o ex-marido (que continuou gravando com o Trio, em nova formação) foram icônicas de uma época de grande efervescência cultural, porém muito machista, em que a culpada de tudo que dava errado nos relacionamentos era sempre da mulher. 

Sua sucessora no estilo, Ângela Maria, começou muito jovem em 1951, e a partir de 54 foi tetracampeã num concurso promovido pela Revista do Rádio como Melhor Cantora do Ano. Intérprete mais bem paga do rádio nesse tempo, foi a que mais trabalhou, gravou e vendeu discos. O sucesso foi tanto que foi obrigada a ter cinco programas semanais por pelo menos metade da década. No Rio, eram dois em emissoras concorrentes, a Nacional e a Mayrink Veiga, algo inédito, fora mais um de TV, alternando-se entre as TVs Tupi e Rio, e como se não bastasse, mais dois em Sampa, na Nacional de São Paulo e na TV Paulista, todos ao vivo. Como Dalva, Ângela imortalizou dezenas de músicas, em ritmo de samba-canção (“Vida de bailarina”, “Orgulho”, “Fósforo queimado”, “Abandono”), tango (“Adeus, querido”) e até mambo afro-cubano (“Babalu”, em 1958, seu emblema vida afora). 

Como se vê, trata-se de um elenco estelar que ajudou a mulher brasileira a ter um novo status na sociedade (ainda que a maioria das canções que entoassem ainda fossem de autoria masculina), e a despertar o interesse da geração fantástica que as sucederia, de cantoras e cantores, todos seus fãs, que não desgrudavam os ouvidos do rádio, deixando-se enfeitiçar por suas vozes, despertando neles o interesse de seguir a carreira na música.



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