Música

CD Quase Memória de Edu Lobo, Mauro Senise e Romero Lubambo

Por: Roberto Muggiati

sexta, 19 de julho de 2019

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Quase memória completa a trilogia que reuniu Edu Lobo, Romero Lubambo e Mauro Senise nos álbuns “Todo sentimento” e “Dos Navegantes” (Grammy Latino 2017). Além da faixa-título, o CD traz as inéditas Silêncio, Peregrina e Terra do Nunca, esta gravada uma única vez pelo Boca Livre. Quase memória foi composta por Edu quando leu o romance de Carlos Heitor Cony, muitos anos atrás. Na hora de escolher o repertório, a plena memória de Edu resgatou Quase memória para nomear o novo disco. 

Talvez o viés literário tenha influenciado este álbum, pródigo em palavras. A letra de Paulo César Pinheiro em Peregrina aponta o dom de Edu Lobo: “Eu só virei violeiro pro coração caminhar, toda estrada é uma ilusão, vida não tem direção, vou pra onde a poesia me quiser levar.” O lirismo irrompe nos versos de Cacaso em Dono do lugar: “Se essa rua que atravessa a minha vida fosse minha, eu queria então cantar pra afastar a solidão da minha vida e a tristeza ir bater noutro lugar.” O Edu letrista confessa em As mesmas histórias: “Sim, eu sei, volto de novo sabendo quanto errei, contando as histórias, as mesmas histórias.” [Por que Edu Lobo não faz mais letras? Minha teoria – não, minha certeza: as canções caem na sua horta tão rapidamente que, para não as perder, ele delega as letras a parceiros escolhidos a dedo.]

O amor pega mais leve na Rosinha de Capinam: “Rosa vai com a sombrinha caminhando, pra onde Rosa caminha, lá vou eu me desviando.” E surgem dois mestres do verbo e do verso. Vinícius de Moraes na letra da inédita Silêncio: “É o amor que te fala, é o amor que se cala e que despetala a flor do silêncio.” E Chico Buarque, com toda a malícia de Lábia, narrada pela ótica feminina: “Palavras de virar cabeça meu amado vai usar, palavras como se elas fossem mãos, tantos rodeios pra enfim me roubar coisas que dele já são.”

Voz jovem de 75 anos, timbre límpido cantando com ternura e compaixão, Edu está aqui no seu auge. Dá uma breve trégua ao amor e mergulha com Cacaso na história de Pernambuco, em Canudos e em Branca Dias, a mártir da Inquisição. A terra do nunca é uma visão do Paraíso nas coloridas imagens de Paulo César Pinheiro: “Tem castelos feitos só de areia e jardins que dão balas de mel, tem ruas cheias de anjos e sereias passeando em carrossel.” Edu explora o folclore em Senhora do Rio, canção de domínio público. Quando a ouviu, descartou a música original, sentou ao piano com a letra na frente e compôs a melodia de uma tirada só. Foi a única vez em que isso lhe aconteceu, a música sair da cabeça de prima... Senhora do Rio figurou na trilha do filme A Guerra de Canudos.

A pujança vocal do disco não intimida o instrumental, ao contrário, o instiga. Mauro Senise e Romero Lubambo, os outros protagonistas da trilogia, superam aqui suas atuações anteriores. Senise investe nas flautas em seis faixas, nos saxes em cinco. Na flauta baixo é soturno em O dono do lugar; saltitante em A terra do nunca. Na descritiva Canudos ataca com flauta e piccolo. E, em Lábia, é sua flauta que faz a solda entre a voz de Edu e a letra de Chico. Com o sax alto, Senise tem solos irretocáveis em Peregrina e Silêncio. Um detalhe de bastidor: a introdução de Mauro ao alto em As mesmas histórias mostra sua intimidade “siamesa” de trinta e cinco anos com Romero Lubambo. Além da abertura, os solos dos dois são impecáveis – ninguém diria que esta faixa foi gravada de primeira... Hábil tecelão das cordas, Lubambo cria com seus acordes e dedilhados uma rica tapeçaria sonora para o canto de Edu. É difícil escolher entre tanta beleza, mas não percam seus solos em A terra do nunca e Peregrina.

Dois convidados muito especiais abrilhantam a festa, A israelense Anat Cohen comparece com sua clarineta cool e brejeira em Lábia; e faz um belo solo bluesy na reflexiva Branca Dias. O acordeonista Kiko Horta ajuda a inventar o clima de fantasia em A terra do nunca; sublinha o canto de Edu em Senhora do Rio e injeta um clima de forró em Canudos. Bruno Aguilar, novamente, marca o álbum com o pulso firme do seu contrabaixo. Desta vez, o “núcleo duro” se abriu para receber ainda o baterista Jurim Moreira, em quatro das onze faixas, e o pianista Cristóvão Bastos, em seis. Cristóvão é um dos fieis da trilogia: é o autor da faixa-título Todo sentimento; e arranjou e tocou piano na inédita instrumental de Edu, Noturna, em Dos Navegantes.

É possível traduzir em música uma obra literária? Muita gente considera a tarefa impossível. Edu foi em frente e montou seu quebra-cabeças em três minutos e quarenta e um segundos, uma melodia lenta em atmosfera de modinha, com o piano de Cristóvão, o sax soprano de Mauro, o violão de Romero e o contrabaixo de Bruno. O resultado deverá se prestar a infindáveis discussões entre amantes da música e da literatura, mas Edu não está nem aí: este é o Quase memória que está na sua cabeça e ninguém vai tirar isso dele.

Saiba mais sobre os artistas:
www.facebook.com/MauroSeniseOficial
www.romerolubambo.com
www.edulobo.com.br 

Links de da música "A Morte de Zambi":


Links de da música "A História de Lily Braun":

 

CD "Quase Memória" de Edu Lobo, Romero Lubambo e Mauro Senise:

Gravadora Biscoito Fino | Preço médio do CD: R$35,00



Encaminhado por: Assessoria de Imprensa Nani Santoro
Fonte da imagem: Divulgação

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