Colunista Convidado

A caixa ao vivo de Nara Leão

De Tárik de Souza – Especial para o IMMUB

quarta, 25 de julho de 2018

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Apelidada “caramujo” na infância por sua timidez, a capixaba Nara Lofego Leão (1942-1989) com sua personalidade luminosa e enorme talento musical, acabou no centro da transição dos movimentos bossa nova/ tropicalismo/MPB, dos anos 1960 aos 80. Ainda assim, destacou-se mais nos estúdios que palcos, embora tenha desenvolvido, aos poucos, seu lado performer, depois de uma estréia acanhada na era dos festivais no programa da TV Record, “Pra ver a banda passar” ao lado de Chico Buarque. Tal era o embaraço da dupla central que foram apelidados “desanimadores de auditório”. Por conta disso, e também das dificuldades técnicas da época, Nara deixou poucos registros gravados em shows.

A caixa de quatro CDs “Nara Leão ao vivo, anos 60/70/80” (Discobertas), meticulosa produção do pesquisador Marcelo Fróes, desvela essa artista oculta em surpreendentes registros de alta qualidade e desinibição. O primeiro CD, foi captado em São Paulo, em 1965, ano de seu mais expressivo disco oficial ao vivo, ao lado de Edu Lobo e do Tamba Trio. Tem apenas oito músicas, sem identificação de local de gravação ou grupo acompanhante. Ex-musa do movimento, em cujo apartamento ocorreram os célebres encontros iniciais da bossa nova, Nara tinha apenas um ano de trepidante carreira e optava por um repertório engajado. Escalados, “Corisco” (Sérgio Ricardo/Glauber Rocha), “Maria Moita” (Carlos Lyra/ Vinicius de Moraes), a rara “Tiradentes” do comediante Ary Toledo e do teatrólogo Chico de Assis, três sambas de Zé Kéti (“Opinião”, “Nega Dina”, “Acender as velas”) e uma ode à reforma agrária de João do Vale (“Sina de caboclo”, com J.B. de Aquino), seus companheiros do célebre show “Opinião”. O segundo CD, de 1972, vai de Chico Buarque (“Soneto”, “Quando o carnaval chegar”, filme de que participou como atriz ao lado do autor e Maria Bethânia), um iniciante Luiz Melodia (“Onde o sol bate e se firma”) e a inesperada parceria do bossanovista Roberto Menescal e o tropicalista Caetano Veloso, a valsa jazz “Cidade pequenina”. E mais, um precioso dueto vocal dela com o flautista Copinha em “Quem é?” (Custódio Mesquita/ Joracy Camargo), sucesso de Carmen Miranda e Barbosa Jr, de 1937.

No terceiro CD, de 1978, Nara é acompanhada pelo então iniciante grupo de choro Os Carioquinhas, onde pontificam os irmãos Raphael (violão 7 cordas) e Luciana Rabello (cavaquinho), “que ficou mais velhinha, completou 17 anos”; além de Mauricio Carrilho (violão de 6) e Celsinho Silva (pandeiro). No roteiro, “Praça Clóvis” (Paulo Vanzolini), “Camisa amarela” (Ary Barroso), “Tigresa” (Caetano Veloso), “Sem compromisso” (Geraldo Pereira/ Nelson Trigueiro), “O seu amor" (Gilberto Gil). Tanto neste disco como principalmente no último, gravado em Belo Horizonte, em 1985, destaca-se o violão da cantora, muito bem calibrado a seu vocal intimista. O repertório é o mais extenso, de 23 músicas. Clássicos da bossa (“Desafinado”, “Samba de uma nota só”, “Você e eu”, “Este seu olhar”, “Só em teus braços”, “Berimbau”), uma raridade infantil de Tom Jobim (“Pra mó de chatear”) e mais composições de João do Vale (“Carcará”, com José Candido), Sidney Miller (“O circo”), Ernesto Nazareth (“Odeon”, letra de Vinicius de Moraes) e Chico Buarque (“João e Maria”, “Vai passar", “Olé olá”, “A banda”).

Nara (re)vive.



Fonte da imagem: Jornal do Brasil

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