Colunista Convidado

Quero ser seu funky, Rio de Janeiro

Por Luiz Felipe de Lima Peixoto

sexta, 28 de fevereiro de 2020

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O que falar do Rio de Janeiro? Além dos milhares de problemas de todo o tipo, vivemos em um lugar descomunal, com uma beleza natural de fazer cair o queixo. É uma metrópole cravejada no meio de pedreiras e mata atlântica.

Nem sempre conseguimos, mas quando temos a oportunidade de fazer uma viagem nacional ou até mesmo para fora do Brasil, podemos entender as diferenças metropolitanas que nos favorecem. Mesmo com toda a adversidade social e política, somos privilegiados pela nossa natureza.

A cidade do Rio que leva o mesmo nome do estado, possui a maior floresta urbana do mundo em seu meio e beira o litoral da Baía de Guanabara, o que proporciona uma atmosfera bastante peculiar entre seus mares, morros, montanhas e cachoeiras. O clima é bastante caloroso, mas na maior parte do ano a temperatura acaba sendo muito agradável.

Vivemos em uma terra que inegavelmente é motivo de inspiração aos mais sensíveis à arte. Afinal, apesar da tensa conjuntura social e política, “o Rio de Janeiro continua lindo, o Rio de Janeiro continua sendo”, ainda mais em fevereiro e março.

Difícil mensurar em palavras o que a música, o que as ondas sonoras representam. Se pudermos comparar algumas sonoridades com a beleza de diversas cidades do planeta, ficamos com o deslumbre que o Rio de Janeiro proporciona principalmente ao olhar. Não é difícil de imaginar um incrível voo de asa delta em um lindo dia de sol na Pedra da Gávea.

A floresta urbana que cruza a cidade é chamada de “Floresta da Tijuca”. E logo me lembro do emblemático bairro da Tijuca, de onde saíram artistas como Tim Maia, Erasmo Carlos, Ed Motta, Tom Jobim, Jorge Ben Jor e Roberto Carlos.

Mas vale uma ressalva para este último nome, afinal, sabemos que o Roberto não é carioca, e embora o “Rei” não tenha nascido aqui, veio para o Rio de Janeiro ainda pequeno e é considerado um carioca nato.

A região do Méier, passando pelo Lins, Engenho Novo, Vila Isabel, e outros bairros ainda mais ao norte. Das proximidades, João Nogueira, Aracy de Almeida, Seu Jorge, Elza Soares, Cartola, Noel Rosa e diversos outros nomes da música brasileira.

A cidade da Guanabara é litorânea e possui um dos maiores portos entre as cidades brasileiras. Foi inaugurado em 1910 e também já foi um dos mais importantes do país. Recebia de tudo um pouco e muito ajudou a nos tornar uma cidade cosmopolita. Todos os principais produtos e pessoas de diferentes nacionalidades, passavam por lá. Desde o primeiro Volkswagen, até as mais desejáveis calças Lee. Haviam turcos, franceses, poloneses, portugueses, descendentes de africanos escravizados e diversas outras nacionalidades. Certamente pela criatividade do seu povo e pelo cenário econômico, político, empresarial, sobretudo das empresas de mídia, o Rio se tornou uma capital cultural, absorvendo artistas de outros estados, que, passando pela “cidade maravilhosa”, tornaram-se grandes celebridades pelo Brasil e mundo afora.

 São coisas que não nos damos conta, mas artistas como Roberto Carlos, Ed Lincoln, Rita Lee, Bebeto, Elis Regina, João Gilberto entre outros tantos, não nasceram aqui, mas acabaram tendo sua arte reconhecida como nativos da cidade de São Sebastião. João Gilberto que é considerado o pai da Bossa Nova, um gênero extremamente carioca e que ajudou a propagar a beleza do Rio de Janeiro para o mundo, era baiano.

Entendo que essa grande mistura que aqui vivemos ou somos descendentes, nos beneficia e nos torna um tipo de referência, uma espécie de lançador de modas e tendências por aí.

Quando pensamos em música na nossa cidade, vale a pena mencionar que o Rio já foi considerado a cidade do samba-canção, teve o próprio samba como motivo em um período que foi aproximadamente de 1930 até 1980, servindo então de inspiração para o surgimento de diversos derivados, como o samba de breque, o sambalanço, o samba-rock, o samba de roda, o samba-jazz, o samba-funk, o suingue de morro, o pagode, o partido alto, entre outros. Houve um desgaste e desde então o samba deixou de estar em extrema evidência, mas definitivamente se estabeleceu como a base da cultura musical carioca e brasileira, em diversos âmbitos e seguimentos musicais. É o principal artigo de construção do nosso imenso e original carnaval, e sempre será.

As músicas norte-americanas e de alguns países da Europa, ganharam o mundo, ajudando na popularização de estilos variados. E as décadas de 60, 70 e 80 são consideradas o boom deste crescimento. O rock saiu do clássico, rompeu as barreiras do progressivo, se firmou como atração popular e o movimento punk criou força. A música pop ganhou forma e evidência através da música soul americana, com o funk e a era da disco music, o movimento black. E o jazz, serviu como uma grande agulha e acabou por costurar todos esses gêneros.

Na música brasileira também importamos de tudo. No Rio de Janeiro recebemos essas influências, misturamos com o nosso samba e desenvolvemos alguns destes estilos à nossa própria maneira: a Bossa Nova é um dos nossos maiores resultados.

A black music que começou por aqui também no período “setentista”, continua empolgando. É diversão garantida nos bailes de charme e até nos intervalos de diversas rodas de samba carioca. As rodas de rap, as batalhas dos MC’s, também batem forte no Rio de Janeiro. O rap chegou e criou mais força a partir dos anos 1990 e também anda muito vivo. A atmosfera influencia bastante e o hip hop produzido no Rio de Janeiro acaba soando diferente do que é produzido em outras cidades brasileiras. Não é melhor, nem pior, mas com certeza bate de outro jeito, tem um outro tipo de flow. 

Os anos passaram e já estamos no século 21, com uma nova geração em plena forma e atividade. E o funk carioca? O que falar de um gênero que começou no Brasil por influências dos rappers norte-americanos de Miami, em meados de 1980 e que atualmente já se encontra em um estágio de 150 batidas por minuto? É o ritmo da moda e acaba sendo o que mais representa os guetos cariocas na atualidade. O funk proibidão, praticamente já não é mais proibidão para esta última geração. Esta vertente do movimento funk já está em um estágio mais “escrachado”, e algumas coisas que não escutávamos antes, acaba soando com mais normalidade para os mais jovens, “as novinhas”.

Vivemos uma era em que os MC’s tornam-se bastante populares em pouquíssimo tempo. E o interessante é que a maioria deles ficam apenas nos singles, visualizações de streamings e apresentações ao vivo. O MC Kevin O Chris, um dos principais da cena funk 150 bpm, teve uma de suas músicas gravadas pelo rapper norte-americano, Drake. Isso mostra o quanto eles fazem sucesso. Acabam não lançando discos e mesmo assim, grande parte dos jovens os conhecem e cantam seus funks, o que, de certa forma, evidencia uma cena underground. Talvez seja o tal fenômeno da internet que os fazem acontecer nos dias mais modernos. 

Para resumir um pouco de tudo o que falamos sobre o que o Rio representa musicalmente, podemos entender que a cidade maravilhosa de ontem já não é mais a mesma, e que hoje em dia, parece que estamos com os ritmos um pouco mais modernos e acelerados. Mesmo após algumas mudanças de preferência de gêneros musicais, o Rio de Janeiro ainda continua sendo o próprio samba, a própria bossa, o chorinho. O Rio também é do rap, é do hip-hop, é do suingue, é do eletrônico, é do charme, é do reggae, é do jazz, é dos blocos festivos de carnaval, é do funk, é do black, é de quem quiser. Mas acima de tudo é do ritmo bem quente, do tipo que acaba passando os 40 graus.

Deixando o funk 150 um pouco de lado, convidamos a todos para ouvirem algo diferente. Trata-se da Black-se Brasil, uma marca inspirada na música negra, através de um recorte que parte dos anos 1990 e segue até os dias atuais, com muito groove brasileiro.

A proposta é misturar lançamentos com músicas que já foram sucesso, mas que provavelmente você não se recorda mais.

Pensando no Rio de Janeiro, preparamos dois repertórios com cerca de 50 minutos cada. Um deles com uma pegada mais Lounge, repletos de sambas e bossas modernas. O outro tem intensão mais de pista, com muito hip-hop e funk-samba. Como a ideia é mostrar um pouco mais do gigante berço cultural que é o RJ, reunimos alguns nomes como Arthur Verocai, Mahmundi, Marcio Local, Seu Jorge, Rogê, Simoninha, João Sabiá, Claudio Zoli, Rosa Emilia, Luana Karoo, Stereo Maracanã, Bangalafumenga entre outros consagrados. Esperamos que dancem e apreciem tudo sem alguma moderação. A água de coco e o chopp gelado fica por conta do IMMuB.

Black-se Brasil - Rio Lounge (clique AQUI e ouça agora!)


Black-se Brasil - Rio na Pista (clique AQUI e ouça agora!)


Luiz Felipe de Lima Peixoto, o Gaoners, é jornalista, produtor e DJ da música negra brasileira. É também um dos autores de “1976 Movimento Black Rio”, obra lançada pela editora José Olympio, 2016.

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