Um papo com o Cazes

Os festivais de choro de ontem e de hoje (PARTE 1)

quarta, 24 de março de 2021

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O encantamento do público com a playlist das 48 semifinalistas do 6º Festival Rio Choro, realizado entre fevereiro e março deste ano, e o conteúdo musical desse conjunto de obras, me fez pensar nas mostras competitivas de choro, que aconteceram e acontecem desde 1977. Foi nesse ano, em plena onda de choro da década de 1970, que surgiram festivais no Rio e em São Paulo. 

No Rio, o Departamento de Cultura da Prefeitura promoveu em agosto o I Concurso de Conjuntos de Choro, vencido pelo grupo Amigos do Choro, em que se destacavam o bandolim de Rossini Ferreira e a flauta de Gerson Ferreira Pinto. O prêmio de melhor composição inédita foi para "Recado" de Rossini. Os Concursos de Conjuntos de Choro aconteceram ainda mais três vezes, premiando nos anos seguintes o Rio Antigo, Nó Em Pingo D'Água e Choro 7. 

Em São Paulo, aconteceu o I Festival Nacional do Choro - Brasileirinho, promovido pela Rede Bandeirantes. O evento obteve grande espaço na imprensa e, em fins de outubro, um júri presidido por Marcus Pereira, dono da gravadora homônima, e que contava ainda com Guerra Peixe, Sergio Cabral, Tárik de Souza e José Ramos Tinhorão, escolheu como vencedor outro choro de Rossini Ferreira, "Ansiedade", defendido pelo grupo Amigos do Choro. O choro vitorioso estava de acordo com o perfil mais conservador do júri mas, em torno da música que recebeu a quinta colocação, "Espírito infantil", uma experiência de fusão pop-chorística da autoria de Mú Carvalho, tecladista da Cor do Som e defendida pelo grupo, surgiu uma empolgante discussão sobre inovação composicional no choro. Em meio a polêmica, o experiente maestro Lindolpho Gaya divulgou uma carta intitulada “A propósito do choro”, que reproduzi na íntegra no capítulo 23 do livro “Choro do quintal ao Municipal”. E Gaya já começava chutando na canela:

“O júri era do maior respeito, composto de valorosos e capazes defensores de nossas tradições populares. O resultado final, porém, foi de estarrecer. Enquanto eu esperava que se premiasse a criatividade dentro dos parâmetros do choro, o que se viu foi exatamente o contrário. Os prêmios maiores foram para a imitação, o pastiche dos choros já compostos até hoje.”

O extenso documento defendia a liberdade para inovação e o espaço para improvisar. Quando no ano seguinte foi realizado o II Festival Nacional do Choro - Carinhoso, aconteceu algo curioso. O veterano K-Ximbinho (Sebastião de Barros), um militante da modernização chorística, ganhou o certame com um de seus choros mais convencionais: “Manda brasa” e reacendeu outra vez a polêmica. O jornalista e chorão Luis Nassif, no artigo "Choro antigo - um festival convencional, mas de muito bom nível", definiu o festival como "polarizado entre os renovadores e os tradicionais”. 

Depois de alguns anos sem eventos de maior porte no gênero, em 1994 o Museu da Imagem e do Som RJ organizou o I Festival de Choro do Rio de Janeiro, que teve como marca o encontro de diferentes gerações como Claudionor Cruz, Altamiro Carrilho e Juventino Maciel, dentre os veteranos e os então novatos Pedro Amorim e Bilinho Teixeira. No ano seguinte foi a vez do evento consagrar um jovem bandolinista que faria história: Hamilton de Holanda, premiado como melhor intérprete e como autor, entre as primeiras colocadas.

Seis anos depois e com o nome de Festival do Choro do MIS – RJ, outro bandolinista de talento, o cearense Jorge Cardoso, arrebatou a plateia e venceu com seu “Balançadinho”. O evento deixou como legado um álbum duplo com registros das 36 semifinalistas, que traça um retrato abrangente daquele momento de transição, em que renovadores e tradicionalistas ainda mediam forças. 

Por fim, chegamos a 2021 e ao 6º Rio Choro, festival organizado pelo soprista e pesquisador Mário Sève e que teve sua competição dividida entre júri e voto popular via internet. Para surpresa da organização, em plena pandemia, com as dificuldades de tocar junto, gravar, etc., nada menos de 273 composições foram inscritas, 85% instrumentais e 15% canções. Tendo participado do júri que escolheu as 48 semifinalistas, e escalado para o júri da final, o autor destas linhas para aqui seu relato, para voltar no mês que vem comentando o resultado. Até lá. 

Henrique Cazes


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