Norte, a região que faz o Brasil dançar
por Lucas Vieira
Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Sete
estados, povos e culturas que, com suas características, formam a Região
Norte do Brasil, espaço de surgimento de importantes manifestações
culturais brasileiras que, até os dias de hoje, fazem o país balançar.
Formada
pela miscigenação entre povos indígenas, colonizadores portugueses e
negros, a região teve sua música criada a partir de elementos trazidos
de cada um desses povos, resultando em ritmos como o carimbó, o siriá e a
marujada.
Com a força da cultura folclórica, as festas populares
também manifestaram suas criações musicais, eternizadas em eventos como
o Festival de Parintins, o Círio de Nazaré, as cavalhadas, congadas,
quadrilhas e o marabaixo.
A partir do século XX, com as inovações
na eletrônica e o desenvolvimento do mercado fonográfico nacional, a
música nortista se amplifica: novas manifestações como a guitarrada, as
festas de aparelhagens que originaram o tecnobrega, o calypso e o
fenômeno da lambada fazem com que a música do norte chegue ao Brasil
inteiro, e, com o passar do tempo, artistas como Fafá de Belém e Banda Calypso conquistam o país.
O reinado do carimbó
No
ano de 1971 foi lançado por Mestre Verequete no mercado fonográfico o
carimbó, estilo musical que nortearia boa parte da música regional
paraense conhecida pelo Brasil. Estreia do cantor Pinduca em LP,
"Carimbó e Sirimbó do Pinduca" reuniu em 1973 características essenciais
da base da música do Pará, estado que concentra grande parte da força
musical do Norte.
Nascido em 1937, Pinduca começou a cantar
carimbó aos 14 anos, e se tornou um destaque no ritmo. Sua produção passeia pelos subgêneros do estilo, como o carimbó
raiz, o pau e corda e o sirimbó (união com o siriá). Aos 36 anos, em
1973, o artista conseguiu com seu LP formatar o gênero musical de forma
radiofônica, fazendo com que se tornasse mais acessível para os ouvidos de
todo o país.
A formatação que Pinduca deu ao carimbó ajudou a
popularizar o gênero e abrir portas para novos artistas e estilos que
surgiriam na música paraense. Suas vestimentas caribenhas, com um chapéu
estilo sombreiro adornado com motivos tropicanos, fazem referência à música latino americana, que teve grande influência na criação do
“pop paraense”.
A guitarra se conecta com a música do Pará
Na
década de 1970, inspirado pela Jovem Guarda, o guitarrista Mestre Vieira desenvolveu um novo estilo de música nortista: a guitarrada. Inserindo
o instrumento eletrônico no regional, o músico criou um gênero
instrumental que adicionava a linguagem da guitarra a ritmos brasileiros
como o chorinho, o carimbó e outros da América Latina como a cúmbia, o
merengue, o mambo e o bolero.
A guitarrada trouxe uma nova
sonoridade para a música paraense e, com seu ritmo dançante, originou
outros gêneros com a inserção da voz nas composições. Dessa mistura
surgiu o calypso, a lambada e também o tecnobrega nas décadas seguintes.
Entre
os principais artistas da guitarrada, se destacam Manoel Cordeiro e Aldo Sena. Este último, ao lado de Mestre Vieira e
Curica, participou do projeto "Mestres da Guitarrada", que lançou CD e DVD
em 2004.
Fafá de Belém: O norte encontra a MPB
Trazendo
influências da música regional do Norte, não só do Pará como também da
raízes indígenas amazônicas, Fafá de Belém se tornou uma grande
referência da região ao atingir o sucesso nas rádios e lojas de disco do
sudeste.
Após participar da trilha sonora da novela "Gabriela", em
1975, Fafá de Belém gravou seu álbum de estreia, "Tamba Tajá", no ano seguinte,
misturando canções regionais paraenses com composições de artistas como
Caetano Veloso, Nelson Ângelo e Luiz Gonzaga. Ao longo de mais de 40
anos de carreira, Fafá se tornou uma das mais celebradas cantoras da
música brasileira, gravando sucessos como “Nuvem de Lágrimas”,
“Vermelho” e “Coração do Agreste”.
Sucesso Mundial
Houve
um momento em que o mundo esteve voltado para a música do Norte. Além do
Festival Folclórico de Parintins, festividade que há 56 anos recebe
turistas do Brasil e do mundo, a lambada, ritmo originário da mistura do
carimbó com a música eletrônica caribenha ganhou o mundo nas décadas de
1980 e 1990. Seu principal expoente, porém, foi o grupo Kaoma, formado
na Bahia. Com investimento de empresários franceses, a banda rodou o
mundo e tornou o gênero um sucesso mundial.
Já em 1996,
foi a vez do grupo Carrapicho, de origem amazonense, brilhar nos
palcos e rádios internacionais. Através do sucesso do hit “Tic, Tic
Tac”, a banda excursionou por diversos países e vendeu mais de 15
milhões de cópias de seus discos.
Teclados, máquinas de ritmo e aparelhagens: A ascensão do tecnobrega
Com
a chegada de equipamentos musicais eletrônicos, um novo ritmo se desenvolveu no Norte do Brasil. Com melodias executadas em teclados
sintetizadores e programações de baterias eletrônicas, surgiu o
tecnobrega, gênero caracterizado pelas temáticas românticas e regionais
somadas à batida marcante dos instrumentos.
Durante a década de
2000, o sucesso do tecnobrega explodiu no Pará e até hoje tem grande
expressão nas festas de “aparelhagens”, equipamentos que unem efeitos de
iluminação com uma grande quantidade de caixas de som, reproduzindo
músicas selecionadas por DJs ou executadas por bandas. Entre os principais representantes do
estilo estão os grupos Ravelly, Eletro Batidão e
Techno Show, onde surgiu a cantora Gaby Amarantos.
Quebrando fronteiras e recordes
Muito
popular também nos anos 2000, a Banda Calypso fez estrondoso sucesso
pelo Brasil. A grafia com “y” do ritmo que também batiza a banda deve-se
a adaptação brasileira do gênero caribenho calipso, caracterizado no
Brasil pela inclusão da influência da guitarrada e da lambada.
Em
16 anos de carreira, a banda formada pelo então casal Joelma e Ximbinha
colecionou hits, como “Dançando Calypso (Cavalo Manco)” e “A Lua Me
Traiu”, eternizadas na memória dos brasileiros. Com o enorme sucesso,
atingiram um recorde ainda inédito no mercado fonográfico nacional,
vendendo dois milhões de cópias de Banda Calypso Pelo Brasil (2006),
única gravação no formato DVD a atingir esse número de vendas nacionalmente.
O Norte na música contemporânea
Apesar
do destaque do Pará e do Amazonas, outros estados do Norte também
produziram músicos de trabalho relevante na música brasileira ao longo dos anos. Em
Roraima, o artista Eliakin Rufino lançou diversos álbuns em que uniu
música, filosofia e poesia. No Acre, nasceu o piano essencial de João Donato. No Amapá, a bela voz de Fernanda Takai.
Hoje, muitas
manifestações que saem da Região Norte conquistam os ouvidos do Brasil.
Um dos principais representantes é o duo AnaVitória, que surgiu em
Tocantins e é um dos maiores representantes do pop atual. Dona Onete,
que gravou seu primeiro álbum aos 73 anos é a principal representante do
carimbó atualmente, com LPs lançados na Europa. Outros talentos como
Jaloo, Lia Sophia, Felipe Cordeiro, Felix Robatto e Luê mostram que a
cultura nortista continua muito viva e mostrando sua pluralidade para
todos os ouvidos.
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