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Em seu aniversário de 80 anos, Roberto Carlos ganha três livros biográficos

quarta, 07 de abril de 2021

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No dia 19 de abril de 2021, Roberto Carlos vai completar 80 anos ganhando três presentes, em sua concepção, “de grego”. Estão previstos para o mês da celebração os lançamentos dos livros “Roberto Carlos, outra vez” (Record), de Paulo Cesar de Araújo, “Roberto Carlos: Por isso essa voz tamanha” (Todavia), de Jotabê Medeiros, e “Querem acabar comigo: Da Jovem Guarda ao trono, a trajetória de Roberto Carlos na visão da crítica musical” (Máquina de Livros), de Tito Guedes. Três livros sobre (e de presente para) o artista que, entre todos que quiseram impedir o trabalho de pesquisadores biógrafos, foi o mais radical em sua tentativa de apagar da história a sua própria história. Na época, eu era repórter do jornal Extra e participei da coletiva de imprensa em que, ao ser perguntado sobre o que achou da recém-lançada biografia, Roberto respondeu: “Não li e não gostei!”. Hoje, depois de três livros lançados, um mestrado e um doutorado, virei uma defensora ferrenha de nós mesmos, pois, com nossos trabalhos de pesquisa, só estamos contribuindo para a manutenção da memória da música brasileira. 

Capa do novo livro de Paulo Cesar de Araújo, "Roberto Carlos Outra Vez" (Foto: Reprodução/Record) 

Já faz 14 anos que Roberto Carlos conseguiu recolher 10 mil exemplares das lojas e proibir a primeira biografia séria sobre ele, “Roberto Carlos em detalhes”, escrita por Paulo Cesar de Araújo. O historiador dedicou mais de 15 anos à pesquisa sobre seu maior ídolo e a publicou em 2006. A medida foi tomada em 2007 por uma Justiça bem pouco imparcial: Paulo Cesar conta na autobiografia “O réu e o rei: Minha história com Roberto Carlos, em detalhes” (Companhia das Letras, 2014) que o juiz responsável pelo caso pediu autógrafo a Roberto Carlos, contou-lhe que era cantor e presenteou o “Rei” com um disco seu. 

Depois do escândalo nacional, o deputado Alessandro Molon, do PT do Rio, criou o Projeto de Lei 393/2011, que ali por 2014 já havia sido aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, a última antes do projeto ir a plenário (estava quase lá). O PL autorizaria a divulgação de imagens, escritos e informações biográficas de pessoas públicas, mesmo sem a autorização da pessoa ou de parentes do biografado. A proposta alteraria o artigo 20 do Código Civil para incluir a possibilidade de divulgação da biografia sem autorização quando a trajetória pessoal, artística ou profissional da pessoa tenha dimensão pública ou haja interesse da sociedade em sua divulgação. Esse mesmo artigo 20 do Código Civil foi escarafunchado pelos advogados de Roberto Carlos, que pegaram brechas para proibir a escrita não autorizada sobre ele. 

Um ano depois de Paulo Cesar de Araújo colocar para fora, em sua autobiografia, as dores de ver sua obra queimando em uma fogueira, como se ainda vivesse nos tempos da inquisição, o Supremo Tribunal Federal mudou o rumo da história das biografias no país. Em 10 de junho de 2015, o STF julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade número 4815 impetrada pela Associação Nacional dos Editores de Livros (ANEL), que afastou definitivamente a exigência prévia de autorização para biografias, reafirmando o direito à liberdade de expressão. A imprensa destacou o inesquecível comentário “cala a boca já morreu” da ministra relatora Carmen Lúcia, que se referia aos tempos de repressão pela ditadura militar no Brasil, e comemorou a derrocada da campanha do Procure Saber contra os livros biográficos.

O grupo liderado pela empresária de Caetano Veloso, Paula Lavigne, rebocou não só o então ex-marido como Gilberto Gil, Chico Buarque e Djavan para acompanhá-la em suas ações em prol da criação de um Projeto de Lei que proibisse as biografias não autorizadas. Jornalistas e historiadores reagiram atacando com força o Procure Saber em matérias de revistas e jornais, publicações em blogs e redes sociais. Logo depois, soube-se que se tratava de uma troca de favores: a turma de Lavigne chegou junto de Roberto como compensação pelo apoio que ele deu à outra batalha do grupo, por direitos autorais. Uma troca, cujo tiro saiu pela culatra. O mercado editorial voltou a se abrir para novas propostas depois de oito anos congelando projetos. Paula, Caetano e os outros foram tachados de censores, Roberto Carlos deixou o Procure Saber e Carmen Lúcia virou a musa de todos nós. 

Eu li e adorei o primeiro livro de Paulo Cesar de Araújo e, também, o segundo. E por isso tenho certeza que o terceiro título de sua trilogia, “Roberto Carlos, outra vez”, também deve estar ótimo. Não li e já gostei desse, do outro e do outro livro que tratam da vida e da obra do Rei, afinal, todos estão preocupados com a mesma coisa: documentar a história da nossa música, cada um com um recorte biográfico. A música é nossa, logo sua história é também. Com uma pegada mais jornalística do que historiadora, os trabalhos do Jotabê Medeiros têm se mostrado muito bons, e por isso acredito no potencial de “Roberto Carlos: Por isso essa voz tamanha”. Tito acaba de estrear como escritor, mas também já espero um bom resultado da transformação de seu trabalho de conclusão do curso de graduação no livro “Querem acabar comigo”, já que ele vem trabalhando com memória da música desde pelo menos metade da faculdade. 

Capas dos livros "Querem Acabar Comigo", de Tito Guedes, e "Por Isso Essa Voz Tamanha", de Jotabê Medeiros (Fotos: Reprodução/Máquina de Livros e Todavia) 

A descrição do famoso episódio do Cavalo de Tróia na “Ilíada” de Homero fez com que a expressão “presente de grego” ficasse famosa para sempre. No entanto, se Roberto Carlos respeitasse o trabalho dos pesquisadores e entendesse de uma vez por todas que nós só escrevemos sobre artistas que amamos, ele passaria um aniversário muito mais leve e cheio de alegrias, sem qualquer soldado pulando de dentro do cavalo para ir ao ataque. Quem sabe ele já entendeu e até resolva ler e gostar dos três novos livros?! Sonhar não custa nada... Os presentes que eu e todos os fãs do músico Roberto Carlos ganhamos são as novas leituras, claro, e ver três autores batendo o pé também pela memória da música brasileira. 

Chris Fuscaldo 

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