Tema do Mês

Elenco: uma Gravadora Cheia de Bossa

por Caio Andrade

quarta, 04 de outubro de 2023

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Há 60 anos, Aloysio de Oliveira fundava o selo Elenco. O que era para ser apenas uma gravadora pequena e sem investimento se tornou um marco na MPB!


O Início
A gravadora Elenco, que quase se chamou “Skindô”, teve sua festa de inauguração no dia 11 de outubro de 1963. Aloysio de Oliveira havia passado pela Odeon na segunda metade dos anos 1950 e depois ficado alguns meses na Philips, mas estava cansado de ver artistas promissores negligenciados pelas grandes gravadoras, a exemplo de Sérgio Ricardo, Baden Powell, Sylvia Telles…imagina dispensar gente desse naipe? 

Aloysio percebeu que, para gravar essa gente talentosa que ele depositava confiança, e do jeito que planejava, precisava ser dono do próprio nariz e ter a sua gravadora. Entre um empréstimo aqui, uma ajudinha ali, fundou a Elenco, dando oportunidade não só aos novatos como Roberto Menescal ou Edu Lobo, como também a artistas veteranos como Aracy de Almeida, Lúcio Alves e Mário Reis.

Bastidores de "Caymmi Visita Tom" em 1964. Da esquerda para a direita: Tom Jobim ao piano, Dori Caymmi no violão, Dorival Caymmi, Danilo Caymmi na flauta, Sergio Barrozo no baixo e Aloysio de Oliveira, de costas. Foto: MIS/RJ.

Apesar da ordem de catálogo ME-1/2/3/4/5, os 5 primeiros discos da Elenco foram lançados de forma simultânea. A saber, respectivamente: “Vinicius e Odette Lara”, “Balançamba”, “A Bossa Nova de Roberto Menescal e Seu Conjunto”, “Baden Powell Swings with Jimmy Pratt” e “Bossa, Balanço, Balada”. 

A Elenco viveu uma fase áurea nos primeiros anos, entre 1963 e 1964 (talvez até possamos estender a 1966 também). Na verdade, “áureo” é um ponto de vista, já que a frase mais lida quando se fala da Elenco era que “não tinha dinheiro”. Mas isso nunca desanimou Aloysio, e ainda bem, porque foi graças a essa teimosia que fomos brindados com belas obras como “Nara”, “Caymmi Visita Tom” e “Edu e Bethânia”.

As Capas
Não tem como falar da Elenco sem destacar as artes de capas de Cesar Villela com as fotos de Francisco Pereira. A dupla já vinha trabalhando com Aloysio na Odeon desde a década anterior mas foi nesse momento que uma verdadeira revolução aconteceu: as capas da Elenco, reduzidas a 3 cores (preto, branco e toques de vermelho), se tornaram um símbolo da bossa nova, conseguindo traduzir a sofisticação e simplificação do gênero musical na parte gráfica. Isso nunca havia acontecido na indústria fonográfica até então.

Mais ou menos 5 anos antes, Villela-Pereira já desenvolviam uma estética própria. Até chegar na Elenco, Cesar percebeu que precisava ir dando uma enxugada nas cores, fontes e elementos das capas dos discos para que eles conseguissem se destacar no meio de um “carnaval de cores”. Na Odeon, Cesar já testava um fundo monocromático com uma foto do artista encarando a câmera, por exemplo.

Capas de Cesar Villela e Francisco Pereira para a Odeon em 1959 e 1960.

Porém, foi na Elenco que a dupla criou a “cara” da bossa nova. Aquelas ideias da Odeon se poliram agora da seguinte maneira: nas primeiras capas, quase sempre Cesar utilizava um fundo branco, foto do artista em alto-contraste, uma brincadeira com o nome do artista (como em “Nara” com setas ou o trocadilho em “Um SR. Talento” no nome de Sérgio Ricardo) e 4 pontos vermelhos espalhados pela capa, sendo um deles a logo da gravadora. Cesar contou que estava meio exotérico nessa época e o número 4 trazia boa sorte.

A estética da Elenco foi tão forte que mesmo sem Cesar Villela a gravadora continuou produzindo capas com esse mesmo padrão gráfico. Demoraram anos para criar uma capa colorida, por exemplo, provavelmente pela falta de dinheiro. Eddie Moyna, um artista chileno, e o ilustrador Mello Menezes, criaram capas para o selo respeitando essa estética, como em “Nâna”, creditada por vezes a Villela. Além disso, diversos artistas e gravadoras, mesmo depois dos anos 1960, continuaram associando “bossa nova” a esse determinado padrão gráfico. Veja abaixo:

"Nara" (Elenco, 1964), por Cesar Villela e Francisco Pereira. "Ao Meu Rio" (Elenco, 1965), por Eddie Moyna e Mello Menezes. "Os Gatos" (Philips, 1964), por Pedro Camargo. "Bossa.SP" (Lua Music, 2009), por Carlos Baptista/Nação Design.

O Fim
Cesar Villela fez as capas da Elenco entre 1963 e 1964. Após isso, atuou na gravadora com trabalhos pontuais ainda nos anos 1960 e buscou novos ares até fora do país, assim como Aloysio de Oliveira, que deixou a gravadora pouco tempo depois também.

A Elenco foi perdendo suas estrelas para as majors do país (Nara, Edu Lobo…) e se desmantelando cada vez mais financeiramente, com trabalhos esporádicos nos anos 1970. A partir de então, funcionou praticamente para relançar as coletâneas da Polygram e fechou de vez as portas em 1984. Porém, o legado foi gigantesco, e é isso que queremos celebrar este mês!

Explore toda a contribuição da gravadora Elenco em nosso site e ouça muita música boa!






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