Historicizando as canções

De compositor da Jovem Guarda à sambista: 80 anos de Luiz Ayrão

quarta, 19 de janeiro de 2022

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Luiz Kedi Ayrão, mais conhecido simplesmente como Luiz Ayrão, nasceu em 19 de janeiro de 1942, na cidade do Rio de Janeiro. Nasceu em uma família humilde, do bairro Lins de Vasconcelos, teve que trabalhar como engraxate na infância, contudo, conseguiu estudar e se formou em Direito, em uma universidade particular. Trabalhava de manhã e estudava a noite, não é de hoje que “apenas” estudar é um luxo para poucos no nosso país desigual. Por causa do seu contato com o ambiente universitário, Luiz Ayrão vai fazer canções conscientemente políticas. Em decorrência disso, em 1977, teve duas composições barradas pela Censura do Regime Militar, o samba “Treze anos” e o choro “Meu caro amigo Chico”, que era uma resposta ao sucesso de Chico Buarque “Meu caro amigo”, lançado em 1976:

Amigo Chico, recebi a sua carta
E talvez eu já não parta
Como estava planejando
Você me diz que a coisa aí tá preta
E na pá e na picareta a gente acaba segurando

Como Paulo Cesar de Araújo mostra em seu livro “Eu não sou cachorro, não”, a canção foi vetada por causa do alvoroço que o nome Chico Buarque causava na época, o argumento para o veto seria que aqueles versos demonstravam “um comportamento político que se constitui numa depreciação e num protesto às normas governamentais vigentes”.

Não vamos esquecer do samba "Treze anos", também existe uma explicação para seu veto. Como foi dito anteriormente, a canção foi feita em 1977, e devemos lembrar que neste ano estava sendo comemorado os 13 anos do golpe de 1964, que para os militares era tratado como uma revolução. No dia 1 de abril de 1977, o então presidente, Ernesto Geisel, outorgou o chamado “Pacote de Abril”, que incluía algumas lei e o fechamento do Congresso. E foi nesse clima que Luiz Ayrão compôs o samba Treze anos:

Treze anos eu te aturo
Eu não aguento mais
Não há Cristo que suporte
Eu não suporto mais
Treze anos me seguro
E agora não dá mais
Se treze é minha sorte
Vai, me deixa em paz

Para os censores a mensagem subversiva era evidente, então, a canção foi censurada. Entretanto, Luiz resolveu alterar o nome da música para “O divórcio”, que era um tema em voga na época, basta lembrar que foi nesse ano que o senador Nelson Carneiro conseguiu aprovar a lei do divórcio, até então era algo impossível no nosso sistema, o máximo que se tinha era o “desquite”. A letra foi enviada para um órgão diferente do anterior, por causa do título o novo censor não viu nenhum problema e a canção foi liberada, e a palavra divórcio não está em nenhuma linha da música:

Um dia eu perco a timidez
E falo sério
E faço as minhas leis
Com meu critério
Eu vou para o xadrez ou cemitério
Mas findo de uma vez
Com seu império

Apesar dessa vitória do nosso querido sambista, o ministro do Exército da época, o general Fernando Belfort Bethlem ouviu a canção e não gostou, boatos dizem que ele adentrou em um prédio da Polícia Federal e soltou os cachorros nos ali presentes. De qualquer forma, essa história nos mostra que não foi apenas a aclamada “MPB”, de Chico e Caetano, como outros, que fez críticas diretas ao regime militar, cantores mais populares como Luiz Ayrão e Odair José também tiveram seus momentos de “subversivos”.

Antes de encerrar, é interessante pontuar que apesar de Luiz Ayrão hoje ser reconhecido como sambista ele começou como compositor, na década de 1960, para a Jovem Guarda, em 1963 Roberto Carlos gravou sua canção “Só por amor”:

Só por amor eu vivo assim
Só por alguém que não gosta de mim
Mas não faz mal, ela um dia há de ver
Como é grande este meu amor

E em 1973 o mesmo Roberto Carlos fez sucesso com outra composição do carioca, dessa vez a canção “Ciúme de você". Em 1974, Luiz Ayrão lançou seu primeiro LP e fez sucesso com a música “No silêncio da madrugada”, e como bem sabemos, não parou por aí, não à toa este texto está sendo feito para homenagear seu aniversário e sua vasta obra. Que as próximas gerações tenham contato com sua obra, como foi contado no texto, foi um compositor bastante importante na história da nossa música.


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