MPB de A a Z

Bons lançamentos de um ano difícil

sábado, 04 de janeiro de 2020

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Esta coluna, por sua natureza, costuma dirigir o olhar para a memória da nossa música, trazendo à luz personagens que marcaram no passado e que não merecem o esquecimento no presente. Nesta primeira do ano, abro uma exceção para falar de artistas e lançamentos do presente.

São três trabalhos musicais que, a meu ver, fizeram bonito em um ano nem tanto, em que a arte tanto penou.

Lágrimas

Paulo César Feital e Lucas Bueno

Paulo César Feital é um dos grandes poetas da MPB. Autor de canções marcantes em parceria com Jorge Simas, Élton Medeiros, João Nogueira, Guinga, Francis Hime, Cristóvão Bastos, Lenine e muitos outros. Foi gravado por uma galeria onde estão os nossos maiores intérpretes – basta citar “Um, dois ou mais”, parceria com Claudinho Azeredo (que mereceu recentemente gravação perfeita e pungente do craque Didu Nogueira), “Labaredas” (com o mestre Simas, uma comovente homenagem a João Nogueira) ou a clássica “Saigon” (com Cartier e Carlão, que teve gravações definitivas de Emílio Santiago e Beth Carvalho).

Lucas Bueno é um jovem compositor que chegou mostrando serviço e dizendo a que veio, versado em diversos gêneros da música brasileira, autor de melodias que já nascem com destino traçado.

A união da dupla só podia dar no que deu: “Lágrimas” (independente) chega a tempo de se candidatar, sem pedir favor, a disco do ano. Casamento perfeito entre canções-orações e letras-poemas, que ainda se dá ao luxo de trazer as participações muito especiais de Moyseis Marques, Nina Wirtti, Vidal Assis, Soraya Ravenle e Cláudio Nucci, além de um timaço de músicos nos arranjos e acompanhamentos.

Corram atrás. Pra ontem.

Água de Moringa 30

Quem garante é Maurício Carrilho, no texto de apresentação: "Cada disco feito pelo Água é impecável, desde quando realizaram o primeiro registro fonográfico". Agora, comemorando três década na estrada da música – caminho trilhado com profissionalismo e coerente maestria – o conjunto Água de Moringa lança mais um álbum primoroso, com repertório que inclui duas composições de um membro do grupo, Jayme Vignoli (o timaço se completa com Josimar Carneiro, Luiz Flávio Alcofra, Marcílio Lopes, André Buxexa e Rui Alvim), de Cristóvão Bastos, do Carrilho, Paulo Aragão, Radamés Gnattali, Guerra Peixe e clássicos da canção instrumental

Longa vida, meninos. Vocês são demais.

Cantos à Beira-Mar

Socorro Lira

Gratíssima e emocionante surpresa para quem, como eu, não a conhecia, a poeta maranhense Maria Firmina dos Reis (1822-1917), primeira romancista brasileira, é autora de versos assim: “Deixa em segredo repetir minh´alma / Que o meu ouvido não me escute o acento / Que és o doce enlevo do meu peito / O bem que me absorve – o pensamento”. A cantora e compositora paraibana Socorro Lira eu já conhecia. Tem uma voz linda, com suavidade e personalidade marcadamente nordestinas, compõe melodias cativantes e delicadas.

O título do álbum “Cantos à Beira-Mar” (tiragem física limitada para colecionadores, com venda exclusiva pelo sítio www.socorrolikra.com.br/loja), é o mesmo do volume lançado por Maria Firmina em 1871. Dele, Socorro extraiu dez poemas para musicar; no disco tem mais um, que é recitado. O trabalho faz parte de projeto maior, chamado “AvivaVoz”, dedicado a poetas brasileiras que viveram e publicaram nos séculos XVIII a XX e não se tornaram conhecidas como merecem. Para esse projeto, a cantora e compositora já musicou 102 poemas, de dez autoras – material a ser mostrado em CDs, songbook, palestras e shows.

Projeto e álbum podem ser encontrados no YouTube. E o CD pode ser ouvido nas plataformas Spotify e iTunes. Pesquisa e trabalho de peso, com resultado primoroso. Parabenizamos Socorro Lira, pela ideia e pelo esforço.

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