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Alaíde Costa, a joia moderna da MPB

sábado, 05 de dezembro de 2020

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No dia 8 de dezembro de 2020, Alaíde Costa completa 85 anos de vida. Nascida e criada no Méier, no Rio de Janeiro, ele ocupa ainda o seu lugar como uma das cantoras mais talentosas da música brasileira, marcada pelo repertório sofisticado e muito bem escolhido.
 
Tímida desde muito cedo, Alaíde resistiu a cantar em público, mas cedeu depois das insistências do irmão, que a ouvia cantando dentro de casa. Aos 16 anos, se apresentou no programa de calouros de Ary Barroso com a canção “Noturno (em tempo de samba)” e ganhou nota máxima do exigente apresentador. 

Poucos anos depois, deu início à trajetória profissional da mesma forma que outras tantas grandes cantoras do período começaram: como crooner de orquestra no Dancing Avenida, no Rio de Janeiro. Na época, essa era a principal vitrine para as cantoras iniciantes. Elizeth Cardoso e Angela Maria, por exemplo, também começaram assim. Não demorou muito e Alaíde chamou a atenção da gravadora Mocambo e começou a gravar seus primeiros discos. 

Foto: Reprodução

O trabalho de estreia foi um 78 rotações com uma canção autoral, “Tens de pagar”, que hoje se tornou uma raridade. Logo depois, em 1959, lançou seu primeiro LP, “Gosto de você”. Nesse disco, apesar de prevalecer o arranjo grandioso que era padrão da época, já é possível perceber a afinidade de Alaíde com a Bossa Nova. O repertório conta com compositores como Tom Jobim, João Donato e Ronaldo Bôscoli, e inclui canções como “Pela rua”, “Minha saudade” e “Lobo bobo”, também gravada naquele ano pelo amigo João Gilberto no disco “Chega de saudade”

A musicalidade da Bossa Nova só entraria mesmo no álbum lançado em 1961, “Joia Moderna”, que se tornou antológico e é até hoje o trabalho mais consagrado de Alaíde. Com produção de Baden Powell, o disco conta com um time de músicos de primeira qualidade e um repertório emblemático. A partir daí, Alaíde entrava definitivamente na Bossa e se consagrava como uma das melhores vozes do Brasil. 
Um ano depois, quando ela se mudou para São Paulo, passou a se apresentar com enorme sucesso nas casas noturnas da cidade e se tornou uma das principais difusoras do estilo carioca na “Terra da Garoa”. Lá, não por acaso, ela fez amizade e estabeleceu uma parceria profunda com outro carioca paulistano, considerado um dos precursores da Bossa: Johnny Alf

Foto: Reprodução 

Ambos tinham muito em comum: eram sofisticados, discretos, vendiam talento e eram um dos pouquíssimos artistas negros do movimento. Talvez por isso, não desfrutavam da mesma notoriedade que os outros artistas, como a própria Alaíde comentou recentemente em entrevista ao jornalista Tom Cardoso: “Fui, sim, vítima de racismo na Bossa Nova, tenho absoluta certeza. Não só por parte de produtores e empresários, que achavam que uma negra só devia cantar sambas e rebolar, como pelos próprios artistas, que nunca mais me procuraram”.

Talvez essa “má vontade” da indústria tenha sido a causa do hiato sem gravações fonográficas entre 1966 e 1972. Durante esse tempo, embora não tenha lançado novos trabalhos, continuou se apresentando pela noite de São Paulo. 

A volta ao disco não poderia ter sido de forma mais memorável. Em 1972, Alaíde Costa foi convidada por Milton Nascimento, seu fã confesso, para gravar no histórico “Clube da Esquina”. Sua interpretação de “Me deixa em paz”, samba de Monsueto e Airton Amorim fez o público notar a falta que a voz de Alaíde fazia e logo no ano seguinte ela se juntou a Oscar Castro Neves para lançar um álbum em conjunto, retomando o fio de um discografia impecável. 



Além de intérprete reconhecida, Alaíde Costa é também uma das pioneiras compositoras mulheres da música nacional. Fez canções sozinha (“Qual a palavra?”, “Afinal”) ou em parceria com grandes nomes da MPB, como Vinicius de Moraes (“Tudo o que é meu” e “Amigo amado”), Tom Jobim (“Você é amor”), Hermínio Bello de Carvalho (“Cadarços”), Geraldo Vandré (“Canção do breve amor”) e muitos outros. 

Hoje, prestes a completar 85 anos, Alaíde mostra que ainda tem muito a oferecer. No início de 2020, em plena pandemia, realizou a primeira live de sua carreira, em uma tocando homenagem ao amigo e parceiro Johnny Alf. Atualmente, ele trabalha ao lado de ninguém menos que Emicida na produção de um novo disco de inéditas que tem tudo para ser antológico. 

Foto: Maurício Nahas

Ontem e hoje Alaíde ainda é a joia moderna da música brasileira. Que o Brasil nunca perca de vista esse tesouro que tem em mãos. 

Texto por: Tito Guedes

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