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85 anos de Hermeto Pascoal, o Bruxo dos Sons

por Tito Guedes

domingo, 06 de junho de 2021

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No dia 22 de junho, um dos mais importantes músicos brasileiros chega aos 85 anos de idade. Vacinado, na ativa e com a mesma energia criativa inesgotável de sempre. É ele, claro, o “Bruxo dos Sons”: Hermeto Pascoal

Embora ele ainda tenha muito o que nos oferecer pelos próximos anos, pode se dar ao luxo de celebrar uma carreira monumental, que já entrou para a história da nossa memória musical. Irreverente e original, sem nunca se curvar a modismos, Hermeto viveu a serviço de sua inventividade sem limites e da liberdade que pulsa em cada novo trabalho. 

Sua obra não conhece as fronteiras que separam o erudito do popular, o moderno do tradicional, o regional do cosmopolita, o jazz do samba, o barulho cotidiano da música sublime, e por aí vai… O seu “som universal”, como ele chama, engloba tudo que possa vir a ser música. E tudo vira música nas mãos de Hermeto


Foto: Reprodução 

Primeiros passos

Hermeto nasceu em junho de 1936 no distrito de Olho d´Água, em Alagoas, e foi criado em Lagoa da Canoa, na época parte do município de Arapiraca. Autodidata e filho de sanfoneiro, seu contato com a música vem de muito cedo. Seu primeiro instrumento foi justamente uma sanfona de oito baixos, que ele aprendeu a tocar com o pai e o irmão. Aos 11 anos já se apresentava em rádios e festas populares de sua cidade. 

Em 1950, aos 14 anos, depois de se mudar com a família para o Recife, formou um trio de sanfonas com o irmão e o compositor e músico Sivuca. Nessa época, por causa de sua semelhança física, acabou ganhando o apelido de “Sivuquinha”. 

Nos anos seguintes, decidido a seguir carreira musical, se apresentou em diversos lugares, aprendeu piano e chegou a participar da Orquestra Tabajara. Em 1961, depois de um período no Rio de Janeiro, mudou-se para São Paulo, onde se consolidou como instrumentista. 

Um dos primeiros grupos profissionais de que fez parte foi o Quarteto Novo, formado por Heraldo do Monte, Théo de Barros e Airto Moreira. Foi esse o time que em 1967 acompanhou Edu Lobo na histórica vitória de “Ponteio” no festival da Record de 1967. 



Carreira solo

Pouco tempo depois, em 1969, convidado pelos amigos Airto Moreira e Flora Purim, Hermeto viajou para os Estados Unidos, onde gravou seu primeiro disco solo, intitulado apenas como “Hermeto”

Por lá se tornou próximo de ninguém menos que Miles Davis, a lenda do jazz norte-americano. Em 1971, no antológico disco “Live-Evil”, Davis chegou a gravar duas composições de Hermeto (sem os devidos créditos): “Igrejinha” (sob o título de “Little Church”) e “Nem Um Talvez”. 
A experiência com esse e outros nomes da música internacional levaram Hermeto a uma nova fase, quando passou a caminhar cada vez mais para um trabalho autoral e bastante experimental.  

Isso ficou visível com seu retorno ao Brasil em 1973, quando lançou o primeiro disco de produção nacional, “A Música Livre de Hermeto Pascoal”, que mistura obras próprias, como “Bebê” e “Serearei”, com releituras de clássicos como “Carinhoso” e “Asa Branca”. 

Mas foi com o disco “Slaves Mass”, de 1976, que Hermeto passou a fazer as experimentações que se tornaram sua marca registrada. Foi esse seu primeiro disco a “tirar música” de sons da natureza e de ruídos de objetos do cotidiano. Na produção desse álbum ele chegou a levar porcos ao estúdios. A participação dos bichos pode ser ouvida na segunda faixa, “Missa dos Escravos”. 



A partir daí, ele passou a desenvolver uma concepção musical que denominou de “som da aura”, que funde todos os sons em prol de uma música livre de amarras sonoras ou estéticas.

 No disco “Lagoa da Canoa, Município de Arapiraca”, por exemplo, aparecem uma fusão com a fala de locutores esportivos, o latido de um cachorro, um papagaio falando, dentre outros “barulhos” que ele transforma em sinfonia. Em “Festa dos Deuses”, lançado em 1992, ele se aprofundou ainda mais nessa experiência e misturou o canto de bichos com falas do poeta Mário Lago e do ex-presidente Fernando Collor de Melo. 

Esses são só dois exemplos dentre muitos outros, que continuam proliferando por sua carreira até hoje. Dono de uma criatividade sem fim e de uma ânsia inesgotável por fazer música, Hermeto nunca deixou de produzir. Há poucos anos, em 2018, ele abocanhou o Grammy Latino de Melhor Disco de Jazz pelo álbum “Natureza Universal”.  

Atualmente costuma se apresentar com cinco formações diferentes: solo, com a Big Band, com Hermeto Pascoal & Grupo, com Orquestra Sinfônica e, claro, com Aline Morena, parceira com quem formou a “dupla” Chimarrão e Rapadura

Revisitar toda essa produção nos seus 85 anos é constatar a sorte que temos em conviver com o brilhantismo e o mistério desse músico que honra o título de “Bruxo dos Sons”. Que esses “hermetismos pascoais”, como disse Caetano, continuem soando por muitos anos na música brasileira. 

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